Se deixamos de
reconhecer como nosso o que o é, recusamos o que somos pelo que não podemos ser
(já que o outro não nos reconhece como idêntico a ele), ou seja, recusamos a
diferença para desejar uma identidade impossível. A identidade se cria e se recria,
se faz através de sua rememoração que implica repetir, mas necessariamente
diferenciar. (MILAN, 1984, p. 87-88).
A
escrita, “o que ele escreve é a consequência do que ele é” (p.77). Mas a
escritura é a ex-sistência presente e
com sentido: “Quando se escreve,
pode-se muito bem tocar o real, mas não o verdadeiro. [...] O real encontra-se
nos emaranhados do verdadeiro. [...] Só é verdadeiro o que tem um sentido, o
real não tem sentido algum”. (LACAN, 2007, p.78-112).
Entre todos os
problemas da criação artística, o que mais imperiosamente requer – e até para o
próprio artista, acreditamos – uma solução teórica, é o do estilo [...] o
artista, com efeito, conceberá o estilo como o fruto de uma escolha racional,
de uma escolha ética, de uma escolha arbitrária, ou, então, ainda, de uma
necessidade sentida cuja espontaneidade se impõe contra qualquer controle, ou
mesmo que é conveniente liberá-la por uma ascese negativa” (LACAN, 1987,
p.375).
O segredo do estilo está na enunciação:
O enunciado é lugar das paródias, do pastiche de todos os jogos de linguagem, mas a enunciação vem da memória e do esquecimento do autor, dos segredos do seu corpo, do ritmo pulsátil de sua mão que segura o estilete da escrita, na letra, sua marca inaugural, inscrição primeira que se escava no Real (BRANDÃO, p.53-54).
Numa
versão psicologizante de estilo, no entanto, Spitzer (1970) vê o estilo como
desvio de uma norma. Assim, o detalhe é revelador da obra, e o estilo expressa
o espírito do autor.
É por esse conjunto de
razões que Lacan nomeia de canalhice a paixão de não querer saber do desejo, a
paixão de criar metalinguagem para representar a verdade na estabilidade do
enunciado, elidindo a diferença real entre enunciação e enunciado, entre desejo
e sua representação. [...] A expressão “queda do objeto” parece designar algo
bastante diferente da realização da fantasia, que Lacan chamou de travessia da
fantasia. Atravessar a fantasia é esvaziar o objeto da consistência imaginária
que garantia a ele esse lugar determinante nas formas de gozar próprias a um
sujeito. É, portanto, dar lugar ao objeto como causa de desejo, não mais de
gozo mórbido. Queda do objeto quer dizer, pois, perda de gozo. [...] A queda
das identificações constitutivas do eu como corolário desse processo é
precondição para que o objeto, e não o eu, possa emergir através do
estilo. (IANNINI, 2013, p.124 &
p.306-7).
Para Whitehead, o
estilo é a eminência do falante, ponto mais alto a que este pode chegar. O
estilo é a letra, a qual é efeito do discurso. Instalação sintomática com
incidências decisivas no campo da ética, o estilo, além de ser um lugar, é um
modo de operação. Tentar depreender os elementos que constituem a sintomática
brasileira implica, pois, para a psicanálise, destacar o estilo que nela vigora
(MAGNO, 1985, p.69).
Está
em nosso poder sermos bons ou maus, fazer ou não fazer. A maldade, neste
sentido, é voluntária. Uma vez que nos tornamos injustos, ou seja, pelo hábito,
não é mais possível não o ser.
VERA MARTA REOLON
Psicanalista
Psicóloga CRP 07/7654
Jornalista MTb 16.069....e outras coisinhas mais....
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