Guilherme Reolon de Oliveira
Coordenador de marketing do Prataviera Shopping, doutorando
em Ética (PUC-RS), com pesquisa sobre o Corporate Philosopher e Felicidade nas
organizações
Neste ano, comemoram-se 100 anos de uma semana que marcou a
cultura e a arte brasileira. Caxias iniciou uma programação dedicada àquela,
com exposição de obras de grandes artistas como Portinari e Di Cavalcanti (na
Galeria Municipal Gerd Borheim), e um espetáculo da Orquestra Municipal de
Sopros, que destacou a obra de Villa-Lobos, O Trenzinho Caipira.
A Semana de Arte de 1922 revolucionou a arte nacional,
propondo, face aos movimentos internacionais do modernismo, um rompimento com o
academicismo (a arte “tradicional”), quase insípida e distante. Com isso, vimos
a criação de uma arte com olhar brasileiro, que não apenas retratasse o daqui,
mas que o fizesse com métodos próprios. Surgiram obras icônicas como Abopuru,
de Tarsila do Amaral, e Macunaíma, de Mário de Andrade.
Os manifestos Pau-Brasil e Antropófago, que fundamentaram
conceitualmente o que a Semana de 1922 radicalizou, trouxeram à tona o tema da
identidade brasileira, tão caro a intelectuais como Sérgio Buarque de Holanda
(Raízes do Brasil) e Gilberto Freyre (Casa Grande & Senzala). Afinal, o que
é ser brasileiro? Carnaval, samba e futebol representam a todos nós, em que
sentido? Para Oswald, o Brasil é antropófago, “come” a cultura estrangeira e a
digere com jeito próprio. Não se trata de uma deglutição, mas de
carnavalização. Quando se fala em carnavalizar, não nos referimos apenas ao
Carnaval em si, mas à maneira de “brincar”, “fantasiar” com nossas origens,
nossos traumas, nossa história. Nesse sentido, o tradicionalismo gaúcho e a Festa
da Uva, por exemplo, são icônicos. Refletir sobre nossa identidade é pensar
sobre o processo de “tornar-se si mesmo”, ser-o-que-se-é, conhecer-se!
Tal processo, porque calcado na tomada de consciência de sua
singularidade, na descoberta de seu desejo, sua diferença, é libertador,
desalienante. Por isso, o constituir identidade acontece por meio da
diferenciação relativa aos outros. Isso nos leva a outro evento de destaque
ocorrido recentemente, o Fórum da Liberdade que, neste ano, adotou o tema “Você
é livre para discordar?”. A discordância é a base da troca: o contato e as
relações com o diferente é o que constitui sociedade. Só há sociedade de
singularidades, de diferentes. Logo, só há relações sociais autênticas e
verdadeiras entre sujeitos discordantes, com opiniões divergentes (sem uso de
violências, mas de ideias). E, nesse sentido, se há liberdade para discordar,
tal liberdade só se efetiva quando a tolerância e o respeito pelo diferente
acontecem de fato. Expressar-se, a partir da liberdade de opinião, sustentáculo
da democracia, só é possível quando os sujeitos discordam, porque pela
divergência, há diálogo, troca, mudança, todos tornando-se si mesmos. Afinal,
como destacara o filósofo E. Levinas, minha liberdade só começa quando o outro
também é livre.