Guilherme Reolon de
Oliveira
Filósofo, sociólogo e
jornalista, doutorando em Ética e Filosofia Política (PUC-RS)
A ONU divulga, todos os anos, o
ranking dos países mais felizes do mundo: Finlândia, Islândia e Dinamarca
sempre figuram nas primeiras colocações. É comum questionarmos os dados,
indagando como países gelados, pouco ensolarados, com alimentação, cultura e
língua “estranhos” a nós, podem ser considerados os mais felizes.
A plataforma de streaming Netflix possibilitou o acesso a produções dos países nórdicos,
praticamente inacessíveis até então. Cenários cinzentos, dias nublados, roupas
pretas e personagens que raramente sorriem. População feliz? Necessário que
diferenciemos felicidade de alegria. E a música “Amor pra recomeçar”, de
Frejat, é icônica nesse sentido: “que você descubra que rir é bom, mas que rir
de tudo é desespero”.
Diz-se que o Brasil é um país
alegre, apesar das agruras, dificuldades e desigualdades sociais.
Carnavalizamos, vestimos uma fantasia, uma máscara, jogamos confetes e
serpentinas, e a banda não deixa de tocar. Assim, depreende-se que alegria é um
estado (estar alegre, em contraposição a estar triste), ao passo que a
felicidade concerne ao ser que, sempre em desenvolvimento, sempre inacabado,
reverbera em movimento. Por isso, Aristóteles, ao tratar da felicidade, a
relacionava à ação, ao exercício da virtude, que só acontece no equilíbrio, no
comedimento, sem excessos.
Felicidade é um processo, de
tornar-se si mesmo, consequência do cuidado de si. Os países nórdicos podem ser
considerados melancólicos, uma posição de introspecção, um olhar para si.
Concerne ao cuidado de si: os cuidados com o corpo, os exercícios físicos, as
meditações, as leituras, as rememorações, as conversas com os amigos, etc.
Trata-se de uma estética da existência, reverberada do “conhece-te a ti mesmo”.
Em suma, ser feliz é
descobrir-se: ter consciência de suas limitações, traçar objetivos,
persegui-los, com coragem para mudar o que se pode, suportar a angústia frente
aos seus fantasmas, dar novos significados àquilo que não é tão agradável e que
não pode modificar.
Ouvi de uma empreendedora: “ou se
faz o que se ama, ou se aprende a amar o que se faz”. Não há mistério em ser
feliz, são as pequenas coisas, pequenos prazeres: estar com os seus, saborear
seu prato favorito, rever momentos e pessoas, atividades que se gosta. Corpo e
mente em equilíbrio. Coerência entre ação e pensamento. Questionar-se: eu
quero, eu posso, eu devo?
A Dinamarca adota uma filosofia
de vida: hygge. Podemos pensá-la em
termos de mindfullness: estar
presente, prestar atenção àquilo que se faz, desligar o “automático”. Com mais
de 400 mil brasileiros mortos na pandemia, falar em felicidade? Parece que o
momento é esse: empatia e tristeza, mas cuidado de si e dos outros....sempre! Em tempos de “bisbilhotices” por tudo, cuidar o outro é muito diferente de cuidar do outro!