Guilherme Reolon de Oliveira
Crítico cultural, jornalista,
filósofo e sociólogo
Diz-se
que há um embate entre conservadores e progressistas. Nos costumes, acirram-se
os ânimos. Mas, refletindo sobre a questão, percebe-se a sua falta de
fundamento lógico e de sentido. Afinal, progressistas, à exceção dos
revolucionários e anarquistas, são os favoráveis à inovação. Algo que, dado o
contexto de época, equivale à atualização e, no extremo, à vanguarda,
provocando rupturas, mais rápidas ou mais lentas, mas inerentes ao passar do
tempo.
Inovação.
In, introduzir, colocar dentro, uma ação nova: ação de introduzir algo novo. A
inovação não nega, não destrói o que há, o que foi construído, o passado. O
progressista não é, assim, contrário ao conservador, posto que não anseia
ignorar o que se conserva, o que se mantém, mas introduzir fato ou ação nova:
oxigenar, para não mofar, não apodrecer.
Algo
como o vestido das candidatas à rainha da Festa da Uva nos ensina a respeito. O
vestido produzido pela Rico Bracco para a princesa Bruna Mallmann foi criticado
por pesquisadora de vestimenta, acusado de ignorar a história dos vestidos das
soberanas, a tradição. Quanto equívoco! Tradição não pode ser algo estanque,
“mumuficado”, ou incorre em contrariedade às suas origens, como dizia Husserl:
“a tradição é o esquecimento das origens”. A própria Festa sempre inovou: de
elitizada à popular, dos clubes sociais às torcidas organizadas. Qual o
propósito do vestido referido? A imigrante, a colona (o cerne referencial das
soberanas) não vestia brilho, saias de armação, cetim.
A
tradição não pode afirmar-se numa destemporização, mantendo-se sem um
auto-questionar-se constante. Concordamos com Vitor Ramil: “para estar viva, a
tradição deve estar justificada na expressão contemporânea – e ela estará
justificada mesmo que o novo represente uma ruptura”(sic). A tradição não deve
ser um peso a ser suportado, nem um amontoado de fórmulas a ser repetida. O
compositor destaca que “assumir um personagem para afirmar a própria identidade
é, na verdade, fragilizá-la”(sic). Orientar a tradição, desapropriando o
popular é uma violência.
A
criação de Fabrício Gelain é o oposto disso. Valoriza o passado, a mulher,
visibiliza suas dores, suas marcas, suas verdades. E o mais importante,
funda-se no passado, mas o atualiza, para o contemporâneo (suas preocupações,
seus temas, o empoderamento do feminino) e para a realidade daquela que o
veste, não incorrendo em estereotipia e personagem.
A
inovação, sem ignorar a tradição, é a chave para práticas alinhadas ao
contemporâneo. Gelain o fez brilhantemente nesta criação e a Festa da Uva
acertaria se solicitasse ao artista a idealização e a produção dos vestidos
oficiais das soberanas.
Desse
modo, também nas empresas, a inovação é algo necessário. Porque ensina a
valorizar o fundamento, a origem, o alicerce, introduzindo novos métodos, novos
modos de fazer, novos ares em ambientes que requerem oxigenação, afinal as
pessoas são o que as movem, são e serão sempre o cerne das organizações.